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Local: Varanda em Pernambuco

sábado, outubro 28, 2006

O Coronel candidato


Fim da tarde desci para tomar um chopinho no Piedade Chopp na esquina aqui em frente. Lugar pequeno, mas muito bem cuidado com ótimos petiscos e o chope no ponto.

Normalmente com pouco movimento, nesse dia as mesas postas na calçada estavam ocupadas. Não sou de muito papo, mas aceitei a oferta e sentei numa mesa ocupada por um chopeiro de barba branca que degustava quibes. Ficamos em silêncio mesmo porque na mesa ao lado um senhor bem apessoado, de fala segura quase discursava falando de política.

Tudo por que alguém perguntou onde era o número tal na avenida em frente. Uma pergunta simples de ser respondida em qualquer lugar do mundo, menos em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco. Muito menos em relação à Avenida Bernardo Vieira de Melo, em Piedade. A numeração da Avenida realmente é de endoidar coroinha. Do dois mil para o quatro mil e quinhentos é um pulinho de uns cem metros. Meu prédio é número 2400, o de frente é três mil e duzentos. E por aí vai.

“Isto aqui é uma vergonha. É o pior lugar do mundo, tudo é esculhambação, é tudo de cabeça para baixo! Também com os políticos daqui, só podia ser assim mesmo. Só dá ladrão. Digo porque conheço, já fui suplente de vereador, conheço todos eles”.

Fiquei curioso. Afinal votar em Jaboatão realmente não é fácil. Candidatos a prefeito, não conheci um que prestasse. Para vereador as opções são maiores, mas mesmo assim é um voto de alto risco.

Sua fisionomia me pareceu familiar e me lembrei de um cartaz de propaganda de um coronel que vi, na última eleição municipal, num restaurante ótimo de comida regional que vou de vez em quando, o Cantinho da Paz.

“Você é o Coronel?”, arrisquei.

“Este mesmo”, emendou.

“Pensei que você tivesse sido eleito”, retruquei.

“Que nada. Tive mil, quinhentos e poucos votos. Fiquei na suplência. Nunca mais. Não vou por a perder meu patrimônio para me eleger nesta merda! Só dá ladrão”.

Apesar do intróito, fiquei bem impressionado com o coronel. Já na reserva, é bem informado, lê revistas, jornais, navega na internet, já viajou “três vezes para a América, não uma, não, três!”, enfim, não é o estereótipo que se pode fazer de um policial militar, principalmente, nesta merda.

Já com platéia assegurada contou, então, que perdeu quase todos os seus bens, “inclusive 17 armas”, no desmoronamento do prédio em que morava, o Areia Branca.

(Faz dois anos o edifício Areia Branca em Piedade, implodiu, esfarelou, virou pó. Seus ocupantes, já de sobreaviso por estranhos estalos do prédio, abandonaram seus apartamentos na manhã anterior ao desabamento. Infelizmente morreram um porteiro e dois empregados de uma firma de reparos que trabalhavam no sub solo e não conseguiram escapar.)

“Eu não ouvi estalo nenhum. Cheguei tarde em casa, já mamado, caí na cama e dormi. Depois de recolher as jóias, minha mulher me acordou e saímos. Veja você, antes ela cuidou das jóias para só depois me acordar! Agora estou morando no Edifício Massapê, já imaginou? Do Areia Branca para o Massapê. Deve ser sina”.

Voltou á política.

“Não agüento mais esse tal de Lula! Como é que se pode votar num ladrão desses? Analfabeto, sem vergonha e ladrão”.

A essa altura dois ou três barbudinhos que saiam do boteco ligaram a antena e ficaram olhando e ouvindo disfarçadamente. E o coronel nem aí. Quando se afastaram, o coronel disse:

“Viu os barbudinhos, pensam que eu não reparei neles me olhando? Garanto que são desempregados, mas votam no Lula. Ô raça!”

“Ninguém mais respeita nada, nem ninguém. O exemplo tem que vir de cima. Do jeito que está, todo mundo perde a compostura. Outro dia quando passava pelo Viaduto Tancredo Neves com minha família, tinha um” féla “da puta mijando no meio da rua! Se não tô com a mulher dava um tiro na bilola dele”!

Vejam que fofo o coronel. Dava um tiro na bilola dele. Não no cacete, no pau, na pica, não, na bilola.

Decididamente, não se fazem mais coronéis como antigamente, nem mesmo nesta merda!

1 Comments:

Blogger Santa said...

Texto impagável!
Bjs

6:06 PM  

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