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Local: Varanda em Pernambuco

terça-feira, março 27, 2007

Fugu, não, João!


João é um nissei de Marília, SP, que se mudou há quase trinta anos com família e cuia para Pernambuco e é um dos meus companheiros de caminhada matinal.

Como bom descendente, adora um sushi, um sashimi e tudo mais que lhe aparecer pela frente. É um bom glutão.

Outro dia nos informava, com água na boca, que logo mais no almoço comeria um osso de patinho!

Ninguém sabia que diabos era aquilo. Arriscaram que deveria ser o osso da carne conhecida por patinho. Não, nada a ver. Era uma espécie de alguma coisa ligada à cartilagem do joelho do boi, se é que boi tem joelho, para ser degustada com feijão preto e charque.

João é assim. Em matéria de comida regional sabe tudo. E só compra nas barracas armadas nas beiras de avenidas nos fins de semana ou em botecos mesmo. Trata-se de um sobrevivente!

Dizem as más línguas que seus níveis de colesterol, triglicérides e que tais são suficientes para enfartar dois ou três elefantes. Mas ele, impávido, todas as manhãs sai fagueiro para sua caminhada com o sol ainda nascendo.

Domingo retrasado João sucumbiu. Uma infecção intestinal deixou-o fora de combate por três dias. Mas também fez por merecer.

Raramente nos encontramos fora da rotineira caminhada, mas naquele domingo tomamos juntos uma cervejinha na praia. Não sou de ficar muito tempo nesses afazeres. Tomei umas duas e subi para um refrescante banho, musiquinha e o conforto da rede em minha varanda. Ficaram João e um grupo de amigos, entre eles Roberta, minha prima.

Na praia tomei com muito gosto um caldinho de mariscos. João já atacou com dois saquinhos de torresmo frito, sequinho, de primeira. Disse que estava com um pouco de fome já que pela manhã, após o café, havia comido somente uma rabada com polenta! Juro, não é brincadeira.

Depois que subi, vi se aproximando da mesa do pessoal uma vendedora de ostras. Roberta adora ostras. E o João? Também. Saciaram-se.

Não sei se vocês comem ostras na praia. As de Piedade vêm, em baldes, de Itapissuma, a 30 ou 40 km de distância, de ônibus, debaixo de uma temperatura de 30 graus, e passeiam na cabeça da vendedora ou vendedor por horas na beira mar ao canto de oshshshshstra, oshshshstra. Os vendedores, assim como as ostras, suam a alma. Suas mãos ensopadas abrem as conchas com uma pequena faquinha.

Convenhamos que não é o ambiente ideal para se degustar o molusco.

Mas tem gente que não resiste, entre elas, João.

Foi premiado. Uma das suas estava, digamos, um pouco estragada o que lhe custou os dias de repouso. Repouso é força de expressão, lógico. Neste tipo de intoxicação o circuito sala, quarto, banheiro, só não é mais movimentado que o da fórmula Indy em Indianápolis.

Por uma feliz coincidência, neste fim de semana saíram duas matérias sobre ostras, uma na Gazeta Mercantil e outra no Jornal do Commercio, de Recife. Guardei-os para dá-los ao João, mas aproveito para dividir com meus leitores algumas informações pitorescas.

Apreciadas há séculos, os gregos as cozinhavam em mel, os romanos as guardavam no sal e o Casanova as consumia cruas pela manhã acreditando em seus valores afrodisíacos.

Na Grécia antiga, além de irem à mesa suas conchas eram utilizadas como cédulas e nelas eram escritos os nomes de cidadãos que caiam em desgraça. Daí veio a palavra ostracismo!

A ostra é um organismo filtrador e por isso concentra grande quantidade de vírus, bactérias e fungos se o ambiente em que vive é poluído. Pode provocar doenças como cólera, hepatite e diversos tipos de infecções intestinais.

Pode também transmitir a difilobotriose provocada pela “Diphyllobothrium latum”, a tênia do peixe. No homem, o verme adulto se localiza no jejuno, e mede entre 3 a 15 metros de comprimento! Entre as manifestações clínicas, pode ocorrer dor epigástrica, dor de fome, anorexia, náuseas, vômitos, astenia e perda de peso.

Para não correr riscos deve-se procurar comer ostras depuradas, ou seja, ostras que ficam por 24 horas em água limpa e purificada com raios ultravioleta eliminando assim todas as suas impurezas.

Em Recife já existe a empresa de depuração de ostras Ostravitta que as fornece aos melhores restaurantes de frutos do mar da cidade.

Também em Santa Catarina, o maior produtor do país, e em Cananéia, litoral de São Paulo, além de criatórios adequados, existem ostras depuradas.

Apesar do João, no Brasil o mercado é ainda incipiente. Na França consome-se 12 quilos por habitante/ano.

Espero que meu amigo não resolva comer, na praia, um baiacu. É que no Japão tem um peixe semelhante, o Fugu, esta belezura que ilustra esse “Meusditos”, cujo sashimi é apreciadíssimo pelos mais exigentes gourmets.

O problema é que o Fugu tem uma concentração de toxinas tão grande que só uma pequena parte de seu corpo pode ser comida. Qualquer erro no corte pode causar a morte em poucos minutos.

No Japão morrem 100 pessoas por ano degustando essa rara e arriscada iguaria.

Te cuida, João, baiacu não!

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

As ostras de santa catarina não são depuradas....
cuidado com elas, pois estão transmitindo hepatite, consulte celia regina barardi , prof UFSC

1:10 PM  
Blogger meusditos said...

Segui o conselho do anônimo e entrei em contato com a Dra. Celia Barardi. Transcrevo sua resposta:

O nosso laboratório já testou uma depuradora de ostras em sistema fechado que
foi projetada pela Blue Water Aquaculture, uma empresa de consultoria em
Aquicultura aqui de Fpolis, presidida pelo Dr. Carlos Poli e com quem temos
bons contactos. Esta depuradora mostrou-se muito eficiente na remoção completa
de Salmonella Thyphimurium das ostras mesmo quando as mesmas foram contaminadas
com grandes quantidades deste patógeno. Este trabalho foi recentemente publicado
na revista Marine Environmental Research 63: 479-489, 2007 (disponível on line).
Agora a SEAP (Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca de Santa Catarina) está
apoiando um projeto desta empresa (e o nosso lab também está neste projeto) que
pretende instalar 4 depuradoras no Estado. Nós faremos o controle sanitário das
ostras depuradas para verificarmos as eficiências das depurações
Até onde eu esteja informada estas depuradoras ainda não estão instaladas.
Sinceramente desconheço se alguma empresa de produção de moluscos bivalves
tenha alguma depuradora já em funcionamento.
Qualquer coisa fique à vontade para me escrever.
Atenciosamente
Célia Barardi

8:41 AM  

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